quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Começando mal as férias


Eu sou uma água-festas. Até mesmo quando se trata de algo bom que está prestes a acontecer comigo. Já pensei em ir a um analista para tratar isso, mas sinceramente falando, prefiro gastar em roupas ou livros, do que com um cara que ganha às minhas custas uma dinheirada só pra se fazer de interessado pelos meus problemas. É certo, sou pessimista, fatalista, e isso acontece principalmente quando estou prestes a fazer uma viagem.

Amo viajar. É uma das coisas que mais gosto nesta vida, mas é inevitável essa sensação de que o meu avião irá cair numa montanha gélida, mesmo se estou indo numa direção completamente oposta às cordilheiras. Maus pensamentos rondam meu cérebro, como esquecer a passagem na mesinha da sala ou o dinheiro para a viagem, que alguém me confudirá com uma terrorista ou que um mafioso me sequestrará ou colocará em uma das minhas malas quilos de cocaína. Então, resignada, reviro a bolsa, consto pela milésima vez que o bilhete está ali, respiro aliviada e confiro o dinheiro que está ok. Em seguida, me tento e verifico as estatísticas de acidentes aéreos, o clima para o dia, acreditando que enfrentarei uma tempestade e uma turbulência dos diabos, e outras estupidezes típicas de uma maníaca depressiva ainda não diagnosticada.

Hoje, exatamente hoje viajo. E como de costume, tenho a sensação que defino "mau pressentimento". Sabe, aquela vozinha interior dizendo que "vai dar merda"? Pois é. Nesta manhã por exemplo, meu celular caiu no chão da forma mais idiota e quebrou. QUEBROU!!! Justo porque ontem recém havia trocado a mísera memória de 254 mega por 2 giga. Estava faceira com os hits do Kid Abelha e Legião que ia escutar, claro gente, não eram 2 gigas de legis e kids. Agora, sinto que isso foi um sinal, um péssimo sinal, que indica que essa viagem não vai ser legal. Também, fui sacar dinheiro no banco e os dois caixas não continham cédulas. Puta merda, só pode ser uma conspiração mafélica contra as minhas tão sonhadas férias.

Medo, muito medo, medo de perder o ônibus que terei que tomar até Guarapuava, medo de que numa curva o bicho caia num buraco e que ninguém ache meu corpo e que o Luis se case em menos de um ano, medo de que um grupo de assaltantes roubem os presentinhos de levo para família, medo de que o cartão de crédito esteja bloqueado para o exterior, medo que no dia em que pise o pé na praia dê um temporal, depois vem o medo de ter que viajar de carro até à praia (obviamente já li o número de acidentes que ocorreram nas estradas brasileiras no último feriado).

Assim que, já estou oficialmente de férias e sofrendo pelo meu estado de pânico, pois acho que tudo vai dar errado e que o melhor era não sair de casa e sim, passar as férias em Buenos Aires mesmo, ficar nesse calor úmido sem praias, sem família. Que o melhor é ver a  Julia quando ela tiver 18 anos, idade em que ela poderá viajar sozinha pra me visitar. Isso seria tão mais simples! Mas não, agora terei que viajar morrendo de medo, sem celular para ligar para o meu advogado quando encotrarem os 700 quilos de cocaína na minha mala, sem dinheiro para fugir do país, pois o cartão de crédito estará bloqueado, sem meus documentos, porque os terei esquecido na mesinha da sala e estarei completamente fudida. E nem a ideia da praia me tranquiliza, porque certamente choverá e não me caberá outra alternativa que passar as férias jogando batalha naval com minha avó e tia.

Mas tudo bem gente, não há nada nessa vida que um valium não resolva e prometo que quando voltar a Buenos Aires, definitivamente, pagarei a um idiota para que me escute e que me dê o veredicto: louca varrida.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Quando descobri que escrever era o "meu negócio"


Primeiro quero esclarecer as aspas. Quando digo "meu negócio" é sem pretenção gente. Porque não gosto do que escrevo, não há clareza e objetividade nas frases que construo. Ainda cometo erros de português (mistura com o espanhol e afins) e acho a minha retórica bastante previsível. Por outro lado, não ganho absolutamente nada escrevendo, o que é uma pena, pois estudei para isso. Portanto, não há negócio, é sem lucro; apenas perda de tempo e talvez de dinheiro, pois o tempo que gasto escrevendo, poderia usá-lo para estudar ou elaborar alguma estratégia para ficar rica e sair finalmente da pindaíba.

Após os esclarecimentos acima, que afirmo e confirmo não se tratar de vaidade e ambição, mas sim de paixão, conto-lhes quando vi que eu não tinha outra habilidade, senão esta, para me comunicar com as pessoas.

Começou quando era criança. Filha única, pais opressivos, não me restava outra que tentar comprá-los com pinturas ou colagens. A coisa estava funcionando, até que entrei para a escola e o que eu fazia deixou de arte para ser entulho. Jamais cogitei a possibilidade de me relacionar com as letras. Minha letra era um desastre, meu caderno e livros cheio de orelhas e quando não tinha uma borracha, cuspia no indicador e esfregava sobre o erro com toda a cara de pau do mundo. As professoras escreviam bilhetes aos meus pais, falavam mal de mim nas reuniões e meu pai, ex professor de matemática e geografia tentava me "dar um jeito". Minhas férias eram no mar, num mar de livros que meu pai comprava para me dar um jeito. Tinha caderno de caligrafia, dicionário, um material completo para me dar um jeito. Mas pau que nasce torto...

Minha pior nota era em língua Portuguesa e não havia tema que me interessasse, até que um dia, na aula de redação, jesus me deu um jeito (tô sendo irônica, tá gente). Tive a brilhante ideia de criar uma história em que envolvia todos os alunos da minha classe. E não é que ficou bom, tão bom que a professora teve a audácia de me inscrever (sem autorização prévia) no concurso de poesia do colégio.
Esse evento era o maior da época. Todos os pais prostados ante os micos comitidos por seus filhos e os alunos, esperando alguém meter os pés pelas mãos para massacrar o infeliz até o dia de sua morte. Participei do consurso. Pior, era uma das finalistas, até que uma bicha desgraçada descobriu que as poesias vinham nada mais e nada menos do disco 4 da Xuxa. Orra, ninguém ouvia aquela música, era o hit mais fracassado da rainha. Foi azar mesmo e fui massacrada até o resto dos meus dias naquele colégio por esse delito.

O trauma não me desanimou. Como havia muitos livros em casa, lia muito. E tentava criar as minhas histórias. Comecei escrevendo cartas de amor para minhas amigas. Depois passei para as de ameaça, quando os namorados das minhas amigas as enganavam com alguma bonitinha recém chegada no colégio. Até minha tia utilizou as minhas habilidades para ameaçar seu ex marido.
Quando despertou o meu interesse pelos homens, descobri que além de feia, desengonçada, sem peito e bunda e pouco popular, eu era sem graça. E para uma mulher nessas condições, a única arma que resta é o humor...que eu não tinha. Aliás, até tinha, só que, somado ao meio jeito desengonçado não causava graça. Acho que no fundo, as pessoas sentiam pena. Mas eu me esforçava, tanto que entrei para o teatro, mas isso não adiantou. Qualquer piada na minha boca era mais chata que missa do galo. Com o tempo me rendi. Ficava sozinha, pelos cantos, com minha feiúra e magreza, atingindo um estado de timidez quase autista. Isso afetou drasticamente a minha vida amorosa, que por ironia do destino era tão engraçada, que parecia uma piada.

Como nunca me dou por vencida, aprendi muito rápido o jogo do sarcasmo.  E igual que anos atrás, passei a castigar as folhas de papel pelas minhas frustrações. O mais louco disso tudo é que as pessoas riam do que eu escrevia. E além do sarcasmo, aprendi que rir da nossa própria desgraça é uma excelente terapia. Tudo bem, que já passei da fase de escrever sobre as injúrias do amor e sinceramente falando, gosto muito de escrever sobre coisas sérias. Mas o coloquial é tão atrativo e diariamente vejo roteiros tão interessantes diante de meus olhos que me tento a escrever sobre isso, até que nasceu este blog.

Se alguém mais, além do Lu, Carol, Pri, entre outros (valeu gente!), leem as merdas que escrevo, não sei. Pode ser que continuo tão fracassada quanto na minha adolescência, mas hoje, posso dizer que meu pai conseguiu dar um jeito na minha vida. Graças à sua insistência, tenho uma letra bonitinha, não cuspo mais no dedo e sou uma devoradora de livros, que ama escrever qualquer coisa, até mesmo piadas que ninguém ri.

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Espírito natalino


Por mais que eu deteste o Natal, é um instinto inevitável esperar das pessoas uma atitude mais fraterna, gentil. Oras, nessa época as pessoas ficam mais sensíveis, estão mais alegres e não por menos, compram roupas novas, comidas deliciosas para a ceia, alguns viajam, outros recebem seus familiares...bem, essa parte a gente pula.

Ontem fui comprar um livro para o meu amigo secreto. O novo que saiu do Gabriel GarciaMarquez. Não preciso dizer que o lugar estava lotado. Um calor, uma multidão anciosa e os vendedores, já com um humor bastante particular, emitiam de seus olhos raios laiser que paralisava qualquer boca que intencionava perguntar. Como estava de óculos escuro, desviei os raios e pude me aproximar do moço moreno de corpo atlético para saber quanto custava o meu presente. O engraçadinho deu meia volta e sumiu. Como não me dei por vencida, o encurralei na sessão de livros religiosos e finalmente pude dizer-lhe que o leitor de preços não funcionava.

"O problema é que nem todas as mulheres sabem usar um leitor de preço", disse o filho da mãe com uma overdose de ironia. Enquanto tentava me recuperar, vi que preço apareceu na tela assim que o sujeitinho passou o objeto pela luzinha vermelha. Como se não bastasse, olhou pra mim e com todo o ódio e frustração que havia juntado naquele dia, vomitou "nem toda mulher tem habilidade com as máquinas, não é mesmo?"
Mandei o espírito natalino para os infernos e devolvi "e é essa mesma falta de habilidade que condena as pessoas a nascerem e a morrerem atrás de um balcão. O que não é a falta de habilidade".

Saí o mais rápido que pude. Não queria levar uma livrada na cabeça, principalmente, porque estávamos perto das bíblias (tô falando daquelas grandonas!).

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Como odiar um homem em 10 passos

Mulheres! Em uma conversa bem de luluzinha com minhas colegas de trabalho, cataloguei as 10 gafes mais cometidas pelos homens. Nunca pensei que fosse tão fácil odiar o homem que você considera ser o amor de sua vida...

1. Ele sugere rachar a conta em todas as saídas, porque diz que você está dando muitas despesas.
2. Ele diz que esqueceu a carteira e pede pra você pagar a conta, "depois a gente acerta", promete.
3.Diz que vai economizar no presente do seu aniversário, porque senão não dará para comprar a playstation junto com os amigos dele.
4. Você passa 4 meses planejando as férias, pesquisando preços, lugares, hotéis, sem a ajuda do seu namorado, claro. Finalmente você consegue um hotel de preço razoável (que inclui massagem, pensão completa, de frente para o mar!) e ele, dias antes da viagem, sugere acampar (obviamente vocês não tem barraca).
5. Além dos seus parentes, você tem que recordar das datas de aniversário dos parentes dele, comprar os presentes sozinha e claro, bancar a dívida toda.
6. No supermercado você pesquisa os preços, compra o que está de promoção, consume marcas secundárias no intuito de economizar. Ele enche o carrinho com besteiras que te farão engordar e pior, diz que o cartão dele está estourado, "depois a gente racha", promete novamente.
7. Suas amigas mostram as fotos das férias que tiveram no Club Med do Caribe e você não consegue evitar a amarga lembrança dos mosquitos te comendo viva no acampamento, enquanto seu namorado tentava fazer fogo para cozinhar o miojo com salsicha.
8. Você pede dinheiro emprestado para seu namorado e ele diz que você tem dificuldade econômica porque compra muita roupa.
9. Você pinta o cabelo de loiro porque sabe que ele gosta de loiras e ele diz que você não ficou bem com aquele cabelo.
10. Você o procura para transar e ele diz que está com dor de cabeça, estressado e que você tem que ser compreensiva.

PS: O Luis pede para esclarecer que ele não comete as 10 gafes descritas acima, rsrs.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Cantada


Para variar, atrasadíssima para o trabalho. Quase na boca do metrô, há poucos metros da escada rolante, ouço uma voz cheia de bossa:

- Bom dia minha princesa!
A voz vinha da lojinha do judeu. E não é que o infeliz era bonito! Investi meu melhor sorriso de segunda-feira e mais confiante o rapaz arriscou:
- Hoje você está mais bonita que ontem.
- Ah é? Já que sabe tanto de mim, que roupa vestia ontem? Touché, pensei.

- Era tanta a beleza, que só lembro que estava linda!
- Ah é, e a que horas você me viu ontem, assim...linda?
- Nessa mesma hora...
- Então meu querido, acho que você está me confundindo com outra. Num domingo às 8 da manhã, jamais estaria na boca de um metrô!
- Puxa, era só pra te dizer que estava bonita.
- Incrível, era apenas para constatar que vocês homens são todos iguais e dizem isso pra qualquer uma. 
Já avançava contra a escada e o insistente continuou:
- Se é pra ganhar outro sorriso desses, prometo que amanhã saberei até o modelo do seu sapato.
Covardia, o cara tem uma loja de sapatos. Como é que vou me livrar desse figura?

- Tá bem, aceito o desafio. Mas com a  condição de que saiba o que usei durante toda a semana. Já arrependida daestupidez que acabava de dizer.

- Se é pra ganhar um sorriso seu, aceito minha princesa.

Ainda bem que do outro lado da rua tem outra boca para entrar no metrô, senão estaria frita. 

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Coisas que incomodam quando se tem 30 anos


Hoje, oficialmente sou uma trintona. Exatamente às 6:50 da manhã entrei para o rol das mulheres que embarcam na luta contra os empregos informais, flacidez e homens ocasionais.

Não tenho problema com a idade em si. Acho chato lidar com a ideologia que abarga essa idade: maternidade, ser bem sucedida profissionalmente e pensar em construir uma família (isso indica ter uma casa, carro...) Cara, então até ontem eu podia me dar ao luxo de ser uma fracassada, não me importar em dormir em albergue, tomar metrô e caminhar por aí com o meu velho all star preto, mas hoje, porque o planeta deu mais uma volta ao redor so sol tenho que me transvestir de mulherzinha insossa?

Assusta, e vem tão rápido que nem dá tempo de se preparar psicologicamente. Portanto, quando ver uma trintona por aí, não cometa as gafes que enumero logo abaixo:

Jamais diga a uma trintona...

1. 30? Parece ter menos (e nem sonhando um "parece-ter-mais").
2. Hoje tem uma promoção do kit Chronos que está imperdível...
3. Ainda vem o creme anti-rugas para os olhos de brinde.
4. E você, não vai casar mais não?
5. Olha que ter filhos depois dos 30 é perigoso.
6. Ter filhos depois dos 30 é difícil: o corpo demora muito mais em se recuperar e o pique não é mais o mesmo.
7. Esse vestido não seria para alguém mais jovem que você?
8. Isso o que estou vendo é uma mecha de cabelos brancos?
9. E aí tia?
10. Você já tem pé de galinha!

E se eu ouvir de alguém uma dessas frases acima, certamente você terá uma perna de galinha enfiada no seu rabo!

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Dezembro: a arte de me deixar pra baixo

Já não é novidade que detesto o fim do ano e não por menos, dezembro já começa mal pra mim: o primeiro dia desse mês é o meu aniversário, responsável por uma infinidade de traumas desde a mais tenra idade. Sim, sofri muito com o fato de quase nunca levar ovada na saída do colégio porque meus coleguinhas... já estavam de férias! E quem é que vai lembrar do seu aniversário quando se tem uma lista gigante de pedidos a fazer ao Papai Noel?

Papai Noel! Velho patético, desgraçado! Passei a minha infância frustrada porque nunca consegui ficar acordada para ver o “bom velhinho” deixar os presentes debaixo da árvore, que minha mãe e eu enfeitávamos com tanto empenho. Hoje, estou quase convencida de que meus pais me embriagavam, atrasavam o relógio, me enganavam, porque recordo que sempre estava acordada às 23:50, e que esses 10 minutos demoravam uma eternidade, simplesmente não passavam. Tanto que, vencida pelo enorme cansaço, terminava dormindo. Acordava ofegante, obviamente umas duas horas depois e meus pais já com o discurso pronto diziam “ele veio, tentou te acordar, mas você não despertou” e cinicamente completavam “mas ele deixou o que você pediu e disse para você conversar menos durante as aulas e não brigar com a sua irmãzinha”. Até que um dia, minha mãe, cansada das minhas indagações que podiam durar horas, me disse com a maior frieza do mundo, assim, na lata, “o papai noel não existe, é o seu pai quem compra presentes de vocês”. Não é preciso dizer mais nada, né.

Já na adolescência, tempos em que você odeia o “espírito natalino”- principalmente porque com ele inclui ter que suportar aqueles parentes chatos, seus pais que ficam ainda mais chatos na presença dessa familiarada inconveniente, e de lambuja seus irmãos, que ainda acreditam no papai noel e por isso te fazem perguntas bestas sobre as renas, claramente tudo o que você deseja é estar em Butã e escapar desse inferno personificado em pinheiro e panetone. Nada na vida pode ser pior que esse martírio!
Assim, as festas se converteram numa tortura para mim. Juro, até hoje padeço de uma fobia particular: entro em pânico ao ver os pratos que sobram na pia após a ceia, enquanto, do outro lado, os parentes desaparecem em cascatas.

Ok, cresci. Alguns traumas superei, mas outros deixaram marcas mais profundas. Por exemplo, tem algo mais triste que se apaixonar (e obviamente não ser correspondida) justo no fim de ano? E mais: saber que só voltará a ver aquele rosto bonitinho depois das férias? Este foi o meu karma no pré-vida-adulta. E enquanto todos improvisavam os sinos de belém, lá estava eu no canto da janela a pensar se o moiçola olhava para o mesmo céu que eu...
Cresci mais. Me apaixonei mais. Por homens que estavam tão longe que falam até outros idiomas. E lá ia eu para a janela, refletir se a posição das estrelas brasileiras eram exatamente iguais que as do céus argentino...

Ano novo: não entendia e ainda não entendo como as pessoas festejavam pelo ano que ia e vinha. Eu sempre pensava “mas um ano se foi e continuo sem encontrar o amor da minha vida”. Hoje penso “putz, mais um ano passou e não consegui o trabalho dos meus sonhos, não fiz a viagem dos meus sonhos, estou ficando velha e flácida e não tenho como bancar o corpo dos meus sonhos, socorrooooooooo!!! E no ano que vem? Quais as perspectivas que posso ter com essa crise mundial? Corro o risco de não conseguir fazer nada do que quero”.
Com a mesma melancolia que esse período provoca, ainda mantenho o mesmo ritual: através de uma janela, olho para as estrelas de um céu que não é o meu. Enquanto festejam em espanhol, tento imaginar o que minha família estará fazendo no Brasil. Posso ver a minha mãe atordoada, coitada, preparando seus deliciosos pratos e preocupada se todos estarão satisfeitos. Meu pai, como boa água-festa que é, discordando de alguma coisa, resmungando e encontrando uma maneira de criar conflito. Meu irmão, que sai com os amigos sem avisar para onde, chegando minutos antes dos votos. Minha irmã, que agora tem um marido e uma filha, estará ajudando a minha mãe, cuidando de sua cria e gritando com o marido por causa de alguma coisa.
Ainda, fixamente, olhando para esse céu, recordo da minha infância: eu e a minha irmã brincando com as bonecas, meu irmão com os seus carrinhos, os desenhos temáticos que passam no dia 25 na tevê...minha mãe organizando toda a zona que os parentes deixaram, e ela, assim como o meu pai , brincando conosco mais tarde. Isso tudo me dá uma saudade, mas uma saudade tão doída que não há formas de gostar de dezembro. De alguma forma ele me representa perda. Ou estarei longe de alguém que amo ou são os anos  já vivi dos que estarei deixando para trás, tendo de aceitar o fato de que o futuro é extremamente incerto. Já não há papais-noéis, fantasia... ficou a luta diária neste mundo hostil.

Mas uma coisa é certa, hoje encontrei o amor da minha vida e é ele quem me abraça e  olha comigo para o céu de dezembro.







segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Mirela e sua LSA

Seus olhos despertaram diferentes naquela manhã. Com certa pressa, caminhou quase levitando até à janela; queria evitar o frio áspero daquele chão tão pisado. Encharcou o vidro da janela com seu rostinho delicado e ali ficou. Teve três minutos e quarenta e sete segundos de dúvida. Suspirou e sorriu pra si. Mostrou a língua numa careta diabólica e viu em seu reflexo uma mancha no dente. Uma folhinha de rúcula. Não pode ser, o que restou da pizza de tomates secos e rúcula de ontem, pensou. Correu até o espelho e lá estava ela. E nem era tão inha assim. Meteu o indicador entre o incisivo lateral e o canino e lá estava entre suas unhas a impertinência em verde musgo.

Com uma certeza antes não tão óbvia, ligou para o celular do Beto. Do outro lado, atendeu:
- Meu amor, bom dia! Pensei que hoje você dormiria até mais tarde. A outra contestou sem preâmbulos:
- Beto, como você me deixou dormir com uma folhinha de rúcula entre os dentes? Estava ali, enorme! Que vergonha... Com muito humor, o outro respondeu:
- Mas querida, você estava tão engraçadinha com ela na boca, que achei melhor deixar
- Deixar? Engraçadinha? Desde que fomos morar juntos prometemos que jamais nos veríamos em condições que pudessem quebrar o encanto da nossa relação.
- Já sei, a LSA: não arrotar depois de comer, não peidar jamais na presença do outro, tomar banho antes de dormir e jamais usar roupa velha, furada ou amassada. Mas na LSA não incluía folha de alface nos dentes...
- Rúcula! Não é isso, se começamos assim vamos nos divorciar...
- Querida, não se preocupe, nem casados estamos. Disse o rapaz com a melhor das intenções.
- Beto, peraê, como assim? Eu achava que você se considerava um homem casado.
- Amor, moramos juntos, somos quase casados, dividimos a casa, as contas...
- Dividimos contas? Pra você a nossa relação é dividir contas?
- Mirela, não foi isso o que eu quis dizer. Façamos assim, passe no meu escritório na hora do almoço, aí a gente almoça juntos. Aproveite que não está trabalhando...
Entre soluços a moça dizia:
- Agora vai jogar na minha cara que estou desempregada e que logo a nossa relação já nem será para dividir despesas? Viu, eu sabia! No dia em que quebrássemos as regras da LSA a nossa relação iria para o brejo. Viu só, viu só.
- Não é nada disso meu anjo, você está nervosa. Por favor fique calma, por favor meu amor, eu te amo, você é a minha mulher e nada neste mundo nos fará divorciar. Melhor assim?
- Bem, sabe como é, estou nervosa porque tenho algo pra te contar. Mas confio em você e sei que não se zangará comigo.
- Claro que não meu amor, diga meu docinho.
- Eu estourei o seu cartão de crédito, aquele que você tinha me dado para caso de emergência.
- O cartão que tinha mais de cinco mil de limite? Por deus Mirela, com que você gastou?
- Com uma coisa.
- Que coisa?
- Uma coisa pra me deixar mais bonita, mas quem vai lucrar com ele é você.
- Mirela, não importa. Mireeeela, você estourou o cartão com algo estúpido e não uma emergência! Assim não há relação que aguente. Eu me matando de trabalhar...
- Ah, mas Beto,vem não, estourar o cartão tampouco estava na LSA. Pra lá de impaciente, mas tentando manter a calma:
- Está bem, venha pra almoçarmos junto, chame aquele seu primo advogado que vamos hoje mesmo definir as cláusulas da Lista de Sobrevivência Amorosa.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Mulher bipolar


Soa meio redundante “mulher bipolar”, já que somos ambíguas por natureza. Mas vale a pena relembrar que somos o que somos para não sermos tãaaao injustas com o sexo oposto...

De manhã:
- Bom dia meu amor, venha aqui que quero te abraçar para que dure até de noite...
- Porra Armando, por que você tem que sujar a merda da toalha de mesa todo o santo dia com essa bosta de café?
De tarde:
- Alô, amorzinho, desculpe por hoje de manhã no café. Sabe como é, estou nervosa com essa reunião com o diretor geral. Você sabe o quanto te amo e o quanto sou feliz por te ter ao meu lado...
- Puta que pariu, por que não atende esse caralho de celular? Tô aqui desesperada! Essa merda de apresentação no power point desconfigurou e eu te falei que salvar nesse “.rtf” iria fuder com a minha apresentação. E agora? Atente pra me ajudar!
De noite:
- Obrigada meu anjo. Não sei o que seria de mim sem você. O diretor falou até em promoção! Podemos aproveitar o dinheiro pra ir a um lugar bem romântico...
- Ah Armanduuu, fala sério. Você tem que entender que depois de um dia estressante como esse, sexo nem pensar! E estou com TPM, não, não rola.
De madrugada:
- Amor, por favor me abrace. Tive um sonho terrível. Te conto como foi?
- Puta merda, é a décima vez que te cutuco pra ver se você para de roncar. Se continuar assim, terá que dormir lá na sala.
PS: Homens, vocês sabem que no fundo amamos vocês.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Como impressionar através do cheiro



Certamente um etólogo diria “os mamíferos mais primitivos já possuíam um mecanismo de identificação de odores, o que lhes permitiam reconhecer o medo, a excitação ou membros da mesma família...” eticétera e tal. Como não sou etóloga e minha pergunta se enquadra mais especificamente à espécie Hommo sapiens, volto a indagar o porquê de certos cheiros fazerem com que amemos ou odiemos uma pessoa sem conhecê-la. Vamos a um caso verídico.

Na faculdade conheci um mamífero excêntrico que logo tornou-se uma de minhas melhores amigas. Ela era desses que reconhecia um cheiro vindo de Júpiter, podendo nutrir um ódio por toda a vida se o infeliz que lhe cruzasse o caminho tivesse um cheiro diferente. Aquilo me parecia uma loucura absoluta e de certa forma preconceituosa; os perfumes são caros e nem todos podem adquirir o melhor sabonete do mercado! Não é o cheiro do perfume que eu me refiro, é o cheiro pessoal, entende? Não, não entendia. Desde então, dediquei uma atenção especial aos que ela julgava fedorentos.

A cada bom dia na faculdade, farejava furtivamente o fulano ou a beltrana. Com muito treino descobri odores que antes não percebia: o de roupa usada 1, 2, 3 vezes....arght!, gente que cheirava a restaurante – porque cozinhava e e provavelmente em sua casa a circulação de ar não devia ser eficiente. Havia o cheiro floral, de naftalina, adocicado, azedo, de cebola, bacalhau e outros que a criatividade “nomenclarural” é impressionante.

Mas o que é certo e até mesmo racional por parte dessa minha amiga, é que realmente existem pessoas cujo cheiro pode atrair ou criar um rechaço tremendo. Outra historinha:

Um colega meu, já com seus 30 e lá vai cassetada, um dia me disse que jamais havia beijado uma mulher. Se fosse no Brasil certamente acharia que o cara estivesse gozando da minha cara. Como o caso foi na Argentina, bem, aqui tudo é possível; pedi para que me contasse melhor sua inquietude. Ele confirmou o que já havia dito antes e disse que simplesmente espantava as mulheres. Ele não era um protótipo de beleza que aprecio, mas tampouco era muito feio. E feio por feio, já vi vários com mulheres muito bonitas. Analisando o meu colega, um ponto importante: ele não era cheiroso, tinha esse cheiro de calça jeans suja...Indiquei alguns perfumes infalíveis rogando que o banho era imprescindível, assim como a roupa limpa. E não é que foi batata? Juro, cinco meses depois ele pegou uma professorinha loirinha de olhos verdes e pegou tão bem pegado que a menina ficou grávida.

Hoje vejo (melhor, sinto) que o cheiro é infalível para causar boa ou má impressão. Portanto, nada de sair por aí cheirando a Tietê; coisas básicas como banho e roupa limpa (olha que nem estou falando de perfumes) pode acelerar aquele bofe ou mina e otras cositas más.

PS: Carol, você é uma gênia!

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Os estímulos da "nova era"

Você já ouviu falar em miss sem teto ou miss cirurgia plástica? Pois nesta última semana esses dois títulos foram dados a duas européias: a uma belga e a uma húngara.

Ainda posso lembrar da expectativa que tinha quando ocorria o miss universo. Como toda menina vaidosa (ou quase, no meu caso), desfrutava ver as belezas exóticas do mundo afora e claro, torcer para a nossa miss Brasil (que sempre perdia para uma venezuelana). Era tão emocionante quanto as olimpíadas ou a copa do mundo.

Mas nos anos 2000 já não se premia com tanto vigor uma beleza naturalmente concebida. E quanto ao futebol, bem, tenho a impressão que se jogava mais pela camisa e não pelos euros...Bem, o lance é que a Hungria quer estimular as cirurgias plásticas através do concurso de miss - o país tem resistência à intervenção cirúrgica. Já a Bélgica pretente promover uma conscientização sobre os moradores de rua.

Sinceramente, os dois prêmios para mim são pra lá de esdrúxulos. Eu é que não queria escancarar a meio mundo que o que sou é artificial ou que passo a minha vida vagando pelas ruas. Por mais que as vencedoras tenham suas compensações financeiras, não são valores para comemorar.

Se com os concursos de miss nos tornamos mulheres infelizes com o peso ou altura ou cor de cabelo ou sei lá mais o quê, imaginem o que não pode suceder se essas duas novas categorias fazem sucesso?
Gente, me nego a fazer pástica e a morar na rua!

sábado, 10 de outubro de 2009

Peru, nãooooo!


Não conheço muita gente dessa nacionalidade não e nem o país. Os poucos peruanos que conheço são gente boa, meio espertalhões, folhados às vezes, mas são alegres, simples e tem ceviche apimentado que é uma tentação.

Hoje, mais precisamente há 30 minutos atrás, me converti em uma peruana convicta; sofri dores de parto ao ver a partida do Peru com a Argentina. Vocês devem estar pensando que sou uma puta de uma cretina, vivendo em Buenos Aires, quase casada com um argentino e torcendo para o Peru. Sim, sou uma putaça de uma cretina e foda-se a moral, ética e todo esse blablabla quando se trata do futebol argentino. Digo de boca cheia que queria muito que a Argentina perdesse. Mas não foi dessa vez. Um dia será.

E o meu namorado? Pobrezinho, como todos os argentinos ficou abaladíssimo com a "semi vitória" do Peru. Enquanto eu pulava e improvisava uns passinhos de axé gritando "é Peruuuuu na cabeça", ele olhava pálido para a televisão e balbuceava um tímido "shhhhh, deixa eu ouvir", quando o desgraçado do Palermo enfiou a merda da bola no gol, no último minuto.

Até agora estou passada, curtindo uma derrota e uma baita vergonha. O Peru perdeu e agora tenho que ficar aguentando um argentino faceiro do meu lado, que me olha apontando o dedo enquanto ri de mim sem o menor pudor.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

O primeiro sapatinho de Cinderela


Até que aquele dia não estava tão frio, segundo o que soube. Os deuses tem sido generosos com Guarapuava; diversas vezes morri de hipotermia naquele lugar, mas este dia não. Fazia calorzinho, até inspirou minha irmã a comprar um all star para a minha sobrinha Juju.

Para a nova aquisição, juntou-se três gerações: neta, mãe e vó. A mãe pensava no preço, a vó no conforto e o pequeno bebê, só Deus sabe. Sei que a pequena princesa foi certeira, entrou na loja e escolheu o modelo mais espalhafatoso: rosa e com lantejoulas. As mais velhas não concordaram com o modelo, mas quem disse que a pequena desistia? Agarrou-se ao objeto, fez birra, gracinha, ameaçou de se atirar no chão, até derreter o coração daquelas duas conservadoras.

Conseguiu: foi pra casa toda contente. Dizem que sequer tira o sapatinho para dormir e que até na banheira com ele ela quer entrar. Essa Juju...

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

"Causa honoris"


 Se temos strippers, animadores de festa e lavadores de defunto, porque não categorizar os seguradores de vela? Essa gente solitária, facilmente identificada em uma balada ou num barzinho romântico, realmente merece o nosso reconhecimento! Ou você pensa que é fácil escutar os estalidos do casalzinho meloso, enquanto num sorriso forçado você tem que dizer para a amiga “está tudo bem”?

Imaginem o sofrimento do/a vela quando sai com a galera (todos casais, lógico) e num ato de piedade (um tanto estúpida) lhe é apresentado um “amigo/a” para que não passe a noitada sozinho/a. Agora, o foda mesmo é quando o cara (ou a mina) é feio/a e tímido/a e durante toda a porra da noite só consegue balançar a cabeça e gemer um “que música boa, né?”. Enquanto ocorre essa cena grotesca, os amigos do/a vela se pegam euforicamente, graças ao maldito e belo refrão daquela musiquinha dos infernos do Jorge Vercilo, e o/a vela assistindo tudinho, apenas assistindo.


É por esses e outros nobres motivos que devemos demonstrar compaixão para com os/as velas, gente querida por todos nós que, ainda no fim da noite, são obrigados/as a escutar a maravilha de noite que tivemos ao lado de nossos respectivos amores.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

A loirinha

Era tão leve que um dia de vento mais abrupto a levaria para longe, como essas folhas secas que dançam no ar num dia qualquer do outono. A menina de cabelos castanhos escuro e de olhos amendoados sempre me fazia desfrutar de qualquer trivialidade típica da sua idade: o novo tênis, a nova boneca, o bolo que comeu no fim de semana. Foi numa dessas que a pequena me mandou essa “sou mais loira que você”.

Pensei que fosse um comentário desses de criança, por isso, não investi muito na conversa. Mas como ela insistia no assunto, resolvi prestar-lhe mais atenção.



- Tia, meus olhos são azuis e meus cabelos loiros são como os das minhas bonecas.
- É mesmo? Perguntei.
- É, respondeu com toda a sua ingenuidade.
- Procurando não desapontá-la, olhei no fundo de seus olhos e disse:
- Querida, você é uma linda garotinha morena. Onde você está vendo os olhos azuis e os cabelos loiros?
- Indignada e quase aos prantos me disse que todo mundo dizia que ela era uma princesa e como correspondia a todas as princesas, ela devia ter os cabelos loiros e olhos azuis. Portanto, ela ela loira e de olhos azuis!
O que fazer numa hora dessas?

sábado, 12 de setembro de 2009

Amor de 8 minutos

Sem pensar muito no conceito "amor", posso dizer que já tive amores de minutos, horas, dias, meses e anos! Não cabe a mim falar de todos. Aqui tratarei apenas de um que durou 8 minutos. Possivelmente, alguém se identificará com o que relatarei agora.

Era uma manhã pedante e fria. Estava sentada no inóspido banco do metrô, quando ele venceu a enorme barreira humana parando logo ali, na minha frente. Meu sono matinal não permitiu identificá-lo entre a multidão, até que escutei sua voz que respondia ao celular.

Fiquei tão encantada que passei a observá-lo com mais curiosidade. Claramente ele percebeu o meu olhar e não sei que diabos deu em mim que lhe dei um sorriso. O rapaz ficou corado imediatamente. Mas estava tão delicioso flertar com aquele desconhecido que já não me importavam os pudores.

Sabíamos que a cada estação alcançada o nosso tempo diminuía, então, desfrutávamos daquilo que nos restava. Já éramos cúmplices. Meu coração batia forte, a respiração estava ofegante e sabia que com ele não era diferente. Finalmente, alguém desocupou um banco e ele sentou exatamente de frente para mim. Confesso que senti vergonha, mas a aventura de me apaixonar por um desconhecido e demonstrar o que sentia era tão irresistível que...deixei me levar pela situação.

Nossos olhos questionavam, "você tem alguém", "onde mora", "a gente daria certo", "será que beija bem", "seríamos felizes", "com quem nossos filhos se pareceriam"...uma infinidade de perguntas inúteis, pois nenhum dos dois se atreveria jamais a perguntar ao menos o nome. Faltavam 3 estações para a última. Nos sentíamos tristes: estávamos apaixonados e era fato que o nosso amor estava prestes a terminar.

Sabia que nunca mais veria aqueles olhos azuis, rosto tímido e mãos delicadas que destoavam com o corpo atlético de mais de 1,80m. Sutilmente, vi que ele tentava descobrir o meu decote, coberto pelo cachecol. Como quem sentia calor, me abanei com o pedaço de pano, fazendo aparecer uma singela curva do vulto desejado. Um sorriso me foi devolvido e num silencioso adeus nos despedimos.

Chegamos. Ajustando os papéis que tinha nas mãos pude ver que era advogado (ok, ninguém é perfeito). Como bom cavalheiro, esperou eu deixar a porta para depois sair. Olhei para trás na esperança de conseguir outro sorriso, um um aceno, mas entre aquele mosaico de gente éramos novamente dois estranhos e o nosso amor se desvaneceu para sempre naquele momento.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Chutando as bolas do mundo

Ou os testículos, para quem ainda não entendeu a mensagem.
Sabe quando você acorda atrasado para o trabalho, sai correndo sem o café-da-manhã, percebe que chove lá fora, mas que você esqueceu a merda do guarda-chuva, e na hora de tomar o metrô tem que enfrentar uma fila enorme e um infeliz tenta pagar a passagem com uma nota alta e a mal humorada da atendente não tem troco, e você afobado olha o relógio sentindo um brote de suor e angústia percorrer o seu corpo, desejando estar no lugar da Aline Morais que vai estrear a novela das 8 linda e glamurosa, percorrendo Paris, Petra, Búzios, beijando o Thiago Lacerda e ganhando horrores por isso? Enquanto você divaga a sua falta de sorte, a atendente do metrô divaga no troco e você certeiramente conclui “que vida de bosta tenho”!
Hoje não acordei me sentindo segundo as descrições acima.. Há dias venho acordando com a convicção de que Deus, nas palavras de Chico Buarque e cantado na saudosa voz da Cássia Eller é...

... um cara gozador
Adora brincadeira
Pois pra me jogar no mundo
Tinha o mundo inteiro
Mas achou muito engraçado
Me botar cabreiro
Na barriga da miséria
Eu nasci brasileiro...”

Com o pequeno detalhe de que nasci “brasileiro-pobre”...

Se ao menos você fosse um crente nas mensagens de auto-ajuda sua vida poderia ser mais fácil. Agora se como eu for racional demais para acreditar na filosofia do bom pensamento, atraindo assim bons fluidos, caro mío, bem vindo ao mundo dos fodidos e pior: conscientes de sua condição e situação de que as coisas pouco provavelmente vão melhorar.

Agora, neste momento estou processando os 100 míseros reais que meu chefe está negando a pagar-me, porque ele acha que o que ganho está acima do piso! O salário que cobro – porque ninguém me dá nada (aliás, detesto a denominação ganhar, muito utilizada por nós brasileiros) é uma piada de muito mau gosto. Moro na Argentina e como qualquer argentino meia-boca como eu, sabe que viver aqui é uma odisséia diária e um atentado a qualquer autoestima. Isso somando às pessoas idiotas com quem tenho que lidar todos os dias e mais a frustração de trabalhar com publicidade, criam verdadeiras turbulências na vida de uma singela brasileira que saiu do país em busca de aventura. E que aventura!

A vontade que tenho agora é de dar um chute tão cruel nos colhões do mundo que precisava compartilhar essa frustração, pois de uma coisa tenho a tardia certeza: a vida é injusta, o sol não nasce para todos e só não sabe quem não quer!

E continuando com a pertinente música do Chico...

...Diz que deu
Diz que dá
Diz que Deus dará
Não vou duvidar, oh nega
E se Deus não dar
Como é que vai ficar, oh, nega?
"à Deus dará" , "à Deus dará"
...

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

O anúncio

As letras garrafais chamaram a atenção da estagiária. Com seus miúdos olhos arregalados lia aquele anúncio tão inusitado, que deveria ser publicado na sessão dos classificados naquela manhã. Deu de ombros, analisou novamente o pequeno texto e concluiu que deveria mostrá-lo ao chefe.

A redação do jornal era caótica. Telefones não paravam de tocar, gente a todo o vapor com suas agendas e celulares. O chefe estava fechado na sua saleta, com um humor terrível. Os dedinhos úmidos se retorciam entre si, tamanho era o seu nervosismo. Esse anúncio poderia custar-lhe o emprego, pensou. Sua tarefa naquele segundo dia de trabalho era checar os classificados e enviar tudo o mais rápido possível para a impressão. Nada desafiador, simples demais. E agora não sabia o que fazer. Olhou mais uma vez para o chefe, para o anúncio e para o relógio. Saco, em dez minutos....

Seu desespero foi cortado por Ritinha, a colega quarentona do lado. “Tá refletindo o quê? Anda logo com isso, que o pessoal lá em baixo não está facilitando”. Simplesmente baixou os olhos e apontou com o queixo o que tinha nas mãos. A outra mal viu o anúncio e riu. “Isso só pode ser uma piada, você é a novata aqui”. A cara de mal convencida da colega encorajou Ritinha, que leu até a última linha e decretou “não publicaremos”. Tinha suas razões para isso, o chefe não estava num bom dia e o prazo para tomar alguma decisão era curto. “Melhor não publicar, isso vai dar merda” aconselhou.

“A merda está na minha mão Ritinha, e quem está fedendo sou eu. Pagaram por este anúncio e quem o recebeu enviou para mim por algum motivo. O jornal não pode se responsabilizar pelos classificados. Imagine se tivéssemos que analisar cada publicidade de motel, por exemplo, verificando se a cama é realmente redonda e não oval ou se o espelho do teto é seguro e não despencará sobre quem estiver abaixo. Isso é ridículo!” A colega concordou, afinal com ou sem merda tratava-se de uma estagiária e eles sempre faziam besteiras. Certamente o que ocorresse logo seria esquecido, como sempre. Um simples anúncio pago... bizarro, mas não se tratava de algo que colocasse o jornal em risco. Tinha razão, deveria ser publicado.

E publicou.

Horas mais tarde, a moça de olhos miúdos recolhia seus poucos objetos sobre a mesa. Não se animava a encarar ninguém, grande demais era a sua humilhação. Deu uma última mirada para sua mesa e saiu arrasada, carregando sua pesada carcaça.

Ritinha que a observava de canto de olho apanhou o telefone e discou rapidamente um número. Do outro lado, uma voz ansiosa escutava as poucas palavras da interlocutora. Sorriso nos lábios, Ritinha teve um chilique de alegria. Agarrou os muitos objetos que tinha sobre sua mesa e os tranferiu para a que estava ao lado. “Finalmente conseguiu o que queria, né sua safadinha”, disse Marta, anos de experiência limpando aquele lugar”. Com os dentes ainda à mostra, confidenciou “é a terceira deste mês meu bem. Nenhuma recém formada me tira daqui. E veja que beleza, agora tenho uma mesa maior e este computador está novinho em folha”, ajeitava-se no seu novo lugar, com o seu mesmo e antigo posto.

Moral da história: O ser humano tão convicto de sua superioridade, ignora sua frágil condição inferior de quem se deixa mover pela mesquinharia de seus baixos instintos.


quinta-feira, 23 de julho de 2009

A criatividade masculina me espanta


Não bastasse uma semana trancada dentro de casa, entre lencinhos de papel e antibióticos e um aborrecimento sem fim, típico dos dias frios e chuvosos, viro para o meu namorado e proponho:

- Vamos ao cinema? Está em cartaz no cine arte um filme interessante...
-Nem sonhando! Bem que sei desses filmes sensíveis que você gosta de ver. Tenho sono só de imaginar!
- Ok, para que não diga que não sou diplomática, vamos tomar uma breja.
- Você sabe que não tomo cerveja desde as férias em Cancum. E mais, pelos antibióticos você não pode ingerir álcool.
- Mas você é chato, hein! Puxa, já não aguento mais ficar trancada dentro de casa. E esse frio...
- Já sei, se quiser sair tenho uma ideia. O que acha de irmos a algum lugar tomar uma vitamina...uma vitamina de banana?

Perplexa, olho para a cara do homem com quem comparto quatro anos da minha vida e penso "ele está gozando da minha cara". Vejo o mocinho indo ao quarto. Todo alegre, vem com a carteira na mão e diz:

- Vai te fazer um bem danano! É muito nutritivo.

Meu Deussss, ele falava sério!!!

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Conversa de pai e filho

Treinou dias para esta conversa:

-Pai, tenho algo pra te contar.
- Algum problema meu filho?
- Não exatamante...
- S
omos amigos, filho, confie em mim. Ou quer me deixar nervoso?
- N
ão é esta a intensão pai, fique calmo, é coisa boba.
- Fiquei, agora conte.
- Vou deixar a faculdade...
- Como? Você enlouqueceu? Deixar o penúltimo ano de engenharia assim, do nada? Existe algo que eu n
ão sei? Meu Deus do céu filho...
- Nada disso pai. Só acho que me dou melhor com as letras. Quero me dedicar à literatura.

O pai respira fundo.

-Literatura... Tá gozando da minha cara? Literatura? Isso é coisa de viado e filho meu vai fazer é ponte e n
ão livrinho pra madame ler! Mas era só o que me faltava...e o que é que você vai escrever? Desde quando sabe escrever?
- N
ão sei pai, posso escrever muitas coisas, poesia...
- Poesia? Filho, você é bicha? Bem que comentei com a sua m
ãe. Nunca entendemos o seu rompimento com a Carlinha...um mulherão. Aposto que foi por causa da poesia.
-
Mais respeito comigo pai. Na verdade ela nunca apoiou os meus projetos. Aspiramos diferentes coisas na vida.
- Mais respeito comigo digo eu, oras! Onde já se viu, largar aquela gostosinha e a faculdade pra escrever rimas...
- N
ão são rimas pai, são poesias. E nem sei se terei jeito para a poes...
- Tá me chamando de ignorante? Pois ent
ão, não vai rolar rima, poesia, merda alguma. Você vai voltar é pra faculdade e pra Carlinha. E se eu ouvir essa história de literatura nesta casa novamente eu juro que te encho de porrada.
- Mas e se eu continuar estudando e dedicar-me à literatura ao mesmo tempo, pode?
- Hum...poder n
ão pode. Já sei, com uma condição. Volte pra Carlinha, coma ela e a melhor amiga dela. Grave tudo com a sua webcam e aí eu te digo se pode.
- Mas pai, isso é monstruoso, desprezível!
- Desprezível é ter um filho viado. Ou é isso ou nada. Passe esse telefone que eu mesmo ligo pra Carlinha...Alô, Carlinha. Tudo bem querida, a Dora e eu também sentimos a sua falta. Só um minutinho que o Beto tem uma coisa importantíssima pra te dizer...

sexta-feira, 3 de julho de 2009

A morte do príncipe encantado

Toda sua vida foi idealista, principalmente quando o assunto era homem. Reconhecia que príncipe encantado era coisa ultrapassada, mas quem disse que isso a afetava. Suas amigas a indagavam se aquilo era tipo ou se realmente pensava assim. Por mais que confirmasse sua convicção, não era o suficiente.
Os comentários maldosos pouco importavam, o que ela gostava mesmo de fazer era encostar a cabeça no travesseiro e imaginá-lo: loiro? careca? moreno? magro? alto? gordo? baixo...

E de tanto insistir nesse negócio de amor à antiga, não é que ela encontrou o tal príncipe!
Um sujeito boa praça, prestes a formar-se em Direito, falava três idiomas e era rico! Não pensou duas vezes e se atirou de braços abertos à exploração de seu novo reino.

Todos os dias se encontravam. E quando isso não era possível, a vida lhe era impossível e insuportável para quem convivia ao seu lado. Era desses amores que causava náuseas, principalmente nas amigas que não tiveram a mesma sorte que a sua.

Passam meses, alguns anos e veio o casamento.
Era realmente uma princesa ao lado de seu príncipe. Mas como toda a história de princesa sempre aparece uma bruxa ou um feitiço...

Tudo começou com o mal hálito matutino, que pôde suportar criando a tática de deixar algumas balas na cabeceira da cama. Porém, logo vieram os roncos, as caspas, as cuecas despejadas no tanque (e porque não no meio da casa?), as meias e toalhas de banho atiradas no quarto. Já não suportava mais o descenso de princesa à de dona-de-casa. Exalava desinfetante com sabão em pó e sua tez já era opaca e encardida feito as cuecas do marido.

Como toda e boa mulher, acreditou que era uma fase e que conversando as coisas poderiam mudar. Até certo ponto tinha razão; o príncipe saiu do pedestal à pia de louças. Mas não por muito tempo. Nem os livros de auto-ajuda que soletrava de cor funcionavam, e os conselhos do psicólogo de canalizar o estresse ao diálogo, tampouco. Que se dane a psicologia! pensou.

Um dia desses, ela recebeu em mãos o atestado de óbito do príncipe: descobriu o motivo pelo qual os dois já não transavam. Valquíria era o seu nome. Sim, nome de biscate. E a puta tinha nome e endereço, mais precisamente um endereço virtual. Aquilo a feriu tão profundamente que decidiu acabar com aquela história de amor para a vida inteira. Não pensou, porque mulher irada não pensa. Aguardou a chegada do homem em seu cavalo branco, partindo a sua cabeça com o multilimpador que comprou numa promoção na TV. Com ar curioso, olhou o sangue brotar do crânio afundado com certo prazer, admitindo que, atirado no chão, a carcaça lembrava muito a de um sapo boi.

Não foi presa. Foi absolvida com uma fiança generosa, paga, claro, com o dinheiro do marido defunto. E não é que ela foi ao seu enterro? Bastante abatida, velou o morto e seus sonhos de conto de fadas, e para concluir o ato fúnebre, num último suspiro de nobreza, atirou contra o caixão o seu cetro de ouro, enterrando definitivamente a última dinastia real.



Related Posts with Thumbnails