segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Dezembro: a arte de me deixar pra baixo

Já não é novidade que detesto o fim do ano e não por menos, dezembro já começa mal pra mim: o primeiro dia desse mês é o meu aniversário, responsável por uma infinidade de traumas desde a mais tenra idade. Sim, sofri muito com o fato de quase nunca levar ovada na saída do colégio porque meus coleguinhas... já estavam de férias! E quem é que vai lembrar do seu aniversário quando se tem uma lista gigante de pedidos a fazer ao Papai Noel?

Papai Noel! Velho patético, desgraçado! Passei a minha infância frustrada porque nunca consegui ficar acordada para ver o “bom velhinho” deixar os presentes debaixo da árvore, que minha mãe e eu enfeitávamos com tanto empenho. Hoje, estou quase convencida de que meus pais me embriagavam, atrasavam o relógio, me enganavam, porque recordo que sempre estava acordada às 23:50, e que esses 10 minutos demoravam uma eternidade, simplesmente não passavam. Tanto que, vencida pelo enorme cansaço, terminava dormindo. Acordava ofegante, obviamente umas duas horas depois e meus pais já com o discurso pronto diziam “ele veio, tentou te acordar, mas você não despertou” e cinicamente completavam “mas ele deixou o que você pediu e disse para você conversar menos durante as aulas e não brigar com a sua irmãzinha”. Até que um dia, minha mãe, cansada das minhas indagações que podiam durar horas, me disse com a maior frieza do mundo, assim, na lata, “o papai noel não existe, é o seu pai quem compra presentes de vocês”. Não é preciso dizer mais nada, né.

Já na adolescência, tempos em que você odeia o “espírito natalino”- principalmente porque com ele inclui ter que suportar aqueles parentes chatos, seus pais que ficam ainda mais chatos na presença dessa familiarada inconveniente, e de lambuja seus irmãos, que ainda acreditam no papai noel e por isso te fazem perguntas bestas sobre as renas, claramente tudo o que você deseja é estar em Butã e escapar desse inferno personificado em pinheiro e panetone. Nada na vida pode ser pior que esse martírio!
Assim, as festas se converteram numa tortura para mim. Juro, até hoje padeço de uma fobia particular: entro em pânico ao ver os pratos que sobram na pia após a ceia, enquanto, do outro lado, os parentes desaparecem em cascatas.

Ok, cresci. Alguns traumas superei, mas outros deixaram marcas mais profundas. Por exemplo, tem algo mais triste que se apaixonar (e obviamente não ser correspondida) justo no fim de ano? E mais: saber que só voltará a ver aquele rosto bonitinho depois das férias? Este foi o meu karma no pré-vida-adulta. E enquanto todos improvisavam os sinos de belém, lá estava eu no canto da janela a pensar se o moiçola olhava para o mesmo céu que eu...
Cresci mais. Me apaixonei mais. Por homens que estavam tão longe que falam até outros idiomas. E lá ia eu para a janela, refletir se a posição das estrelas brasileiras eram exatamente iguais que as do céus argentino...

Ano novo: não entendia e ainda não entendo como as pessoas festejavam pelo ano que ia e vinha. Eu sempre pensava “mas um ano se foi e continuo sem encontrar o amor da minha vida”. Hoje penso “putz, mais um ano passou e não consegui o trabalho dos meus sonhos, não fiz a viagem dos meus sonhos, estou ficando velha e flácida e não tenho como bancar o corpo dos meus sonhos, socorrooooooooo!!! E no ano que vem? Quais as perspectivas que posso ter com essa crise mundial? Corro o risco de não conseguir fazer nada do que quero”.
Com a mesma melancolia que esse período provoca, ainda mantenho o mesmo ritual: através de uma janela, olho para as estrelas de um céu que não é o meu. Enquanto festejam em espanhol, tento imaginar o que minha família estará fazendo no Brasil. Posso ver a minha mãe atordoada, coitada, preparando seus deliciosos pratos e preocupada se todos estarão satisfeitos. Meu pai, como boa água-festa que é, discordando de alguma coisa, resmungando e encontrando uma maneira de criar conflito. Meu irmão, que sai com os amigos sem avisar para onde, chegando minutos antes dos votos. Minha irmã, que agora tem um marido e uma filha, estará ajudando a minha mãe, cuidando de sua cria e gritando com o marido por causa de alguma coisa.
Ainda, fixamente, olhando para esse céu, recordo da minha infância: eu e a minha irmã brincando com as bonecas, meu irmão com os seus carrinhos, os desenhos temáticos que passam no dia 25 na tevê...minha mãe organizando toda a zona que os parentes deixaram, e ela, assim como o meu pai , brincando conosco mais tarde. Isso tudo me dá uma saudade, mas uma saudade tão doída que não há formas de gostar de dezembro. De alguma forma ele me representa perda. Ou estarei longe de alguém que amo ou são os anos  já vivi dos que estarei deixando para trás, tendo de aceitar o fato de que o futuro é extremamente incerto. Já não há papais-noéis, fantasia... ficou a luta diária neste mundo hostil.

Mas uma coisa é certa, hoje encontrei o amor da minha vida e é ele quem me abraça e  olha comigo para o céu de dezembro.







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