A redação do jornal era caótica. Telefones não paravam de tocar, gente a todo o vapor com suas agendas e celulares. O chefe estava fechado na sua saleta, com um humor terrível.
Seu desespero foi cortado por Ritinha, a colega quarentona do lado. “Tá refletindo o quê? Anda logo com isso, que o pessoal lá em baixo não está facilitando”. Simplesmente baixou os olhos e apontou com o queixo o que tinha nas mãos. A outra mal viu o anúncio e riu. “Isso só pode ser uma piada, você é a novata aqui”. A cara de mal convencida da colega encorajou Ritinha, que leu até a última linha e decretou “não publicaremos”. Tinha suas razões para isso, o chefe não estava num bom dia e o prazo para tomar alguma decisão era curto. “Melhor não publicar, isso vai dar merda” aconselhou.
“A merda está na minha mão Ritinha, e quem está fedendo sou eu. Pagaram por este anúncio e quem o recebeu enviou para mim por algum motivo. O jornal não pode se responsabilizar pelos classificados. Imagine se tivéssemos que analisar cada publicidade de motel, por exemplo, verificando se a cama é realmente redonda e não oval ou se o espelho do teto é seguro e não despencará sobre quem estiver abaixo. Isso é ridículo!” A colega concordou, afinal com ou sem merda tratava-se de uma estagiária e eles sempre faziam besteiras. Certamente o que ocorresse logo seria esquecido, como sempre. Um simples anúncio pago... bizarro, mas não se tratava de algo que colocasse o jornal
E publicou.
Horas mais tarde, a moça de olhos miúdos recolhia seus poucos objetos sobre a mesa. Não se animava a encarar ninguém, grande demais era a sua humilhação. Deu uma última mirada para sua mesa e saiu arrasada, carregando sua pesada carcaça.
Ritinha que a observava de canto de olho apanhou o telefone e discou rapidamente um número. Do outro lado, uma voz ansiosa escutava as poucas palavras da interlocutora. Sorriso nos lábios, Ritinha teve um chilique de alegria. Agarrou os muitos objetos que tinha sobre sua mesa e os tranferiu para a que estava ao lado. “Finalmente conseguiu o que queria, né sua safadinha”, disse Marta, anos de experiência limpando aquele lugar”. Com os dentes ainda à mostra, confidenciou “é a terceira deste mês meu bem. Nenhuma recém formada me tira daqui. E veja que beleza, agora tenho uma mesa maior e este computador está novinho em folha”, ajeitava-se no seu novo lugar, com o seu mesmo e antigo posto.
Moral da história: O ser humano tão convicto de sua superioridade, ignora sua frágil condição inferior de quem se deixa mover pela mesquinharia de seus baixos instintos.